Mensagem

"Não permita que aquilo que você chama de amor se transforme em obsessão.
Amor é liberdade.
Amor é vida.
Jamais prisão ou limitação."

Militão Pacheco

quarta-feira, 1 de abril de 2009

A caridade

Revista Espírita, agosto de 1858

PELO ESPÍRITO DE S. VICENTE DE PAULO
(Sociedade de Estudos Espíritas, sessão de 8 de junho de 1858)
Sede bons e caridosos - eis a chave do céu, posta em vossas mãos; toda a felicidade eterna está contida nesta máxima: "Amai-vos uns aos outros." Não pode a alma elevar-se às regiões espirituais senão pela dedicação ao próximo; ela não encontra felicidade e consolação senão nos arroubos da caridade. Sede bons, ajudai aos vossos irmãos, ponde de lado essa horrível chaga do egoísmo. Esse dever cumprido vos deve abrir as vias da felicidade eterna. Aliás, entre vós quem não sentirá o coração pulsar e a alegria íntima expandir-se pela prática de uma obra de caridade? Não deveríeis pensar senão nesta espécie de volúpia proporcionada por uma boa ação, com o que ficaríeis sempre no caminho do progresso espiritua1. Não vos faltam exemplos: só a boa vontade é que rareia.
Vede a multidão de homens de bem, cuja lembrança piedosa a vossa história relembra. Eu vo-los citaria aos milhares, aqueles cuja moral só tinha um fito - melhorar o vosso globo. Não vos disse o Cristo tudo quanto concerne às virtudes de caridade e do amor? Por que são postos de 1ado os seus divinos ensinamentos? Por que tapam os ouvidos às suas divinas palavras e cerram o coração a todas as suas máximas suaves?
Gostaria que a leitura do Evangelho fosse feita com mais interesse pessoa1. Mas abandonam esse livro, transformam-no em expressão vazia e letra morta; deixam ao esquecimento esse código admirável. Vossos males provém do abandono voluntário em que deixais esse resumo das leis divinas. Lede, pois, essas páginas de fogo do devotamento de Jesus e meditai-as. Eu mesmo me sinto envergonhado de ousar prometer-vos um trabalho sobre a caridade, quando penso que nesse livro encontrais todos os ensinamentos que vos devem levar às regiões celestes.
Homens, fortes, abraçai-vos; homens fracos, forjai as vossas armas, de vossa doçura e da vossa fé; tende mais persuasão, mais constância na propagação de vossa nova doutrina. Nós só vimos trazer-vos um encorajamento; é apenas para vos estimular o zelo e as virtudes que Deus permite nos manifestemos a vós. Mas se quisésseis, não necessitaríeis senão do auxílio de Deus e de vossa própria vontade. As manifestações espíritas não foram feitas para os olhos fechados e para os corações indóceis. Há entre nós, homens que devem realizar missões de amor e de caridade: escutai-os, exaltai a sua voz; fazei resplandecer os seus méritos e aos próprios sereis exaltados pelo desinteresse e pela fé viva de que vos penetrardes.
Muito extensos seriam os avisos que vos deveriam ser dados sobre a necessidade de alargamento do vosso círculo de caridade e de neles incluir todos os infelizes cujas misérias são ignoradas, todas as dores que devem ser buscadas em seus próprios redutos, para consolar em nome desta virtude divina: a caridade. Vejo com satisfação que homens eminentes e poderosos ajudam esse progresso, que deve unir todas as classes humanas - os felizes e os desgraçados. Coisa estranha! Todos os infelizes se dão as mães se ajudam reciprocamente na sua miséria. Por que são os felizes mais difíceis de ouvir a voz do infeliz? Por que há de ser uma poderosa mão terrena que tenha de dar impulso às missões de caridade? Por que não respondem com mais ardor a esses apelos? Por que deixam que a miséria, assim como o prazer, manchem o quadro da humanidade?
A caridade é a virtude fundamental, que deve sustentar todo o edifício das virtudes terrenas. Sem ela não existem as outras. Sem caridade não há fé nem esperança, porque sem a caridade não há esperança de uma sorte melhor, nem interesse moral que nos guie. Sem caridade não há fé, porque esta é um puro raio, que faz brilhar uma alma caridosa; a caridade é a sua conseqüência decisiva.
Quando deixardes que o vosso coração se abra à súplica do primeiro infeliz que vos estender a mão; quando lhes derdes sem indagar se sua miséria é fingida ou se seu mal tem um vício como causa; quando deixardes toda a justiça nas mãos divinas; quando deixardes no Criador o castigo de todas as falsas misérias; enfim, quando praticardes a caridade pelo só prazer que ela proporciona, sem visardes a sua utilidade, então sereis os filhos amados de Deus e ele vos chamará a si.
A caridade é a âncora eterna de salvação em todos os globos: é a mais pura emanação do próprio Criador; é a sua própria virtude, dada às criaturas. Como poderíeis desconhecer esta suprema bondade? Com tal pensamento, qual seria o coração bastante perverso para recalcar e repelir esse sentimento divino? Qual seria o filho suficientemente mau para se rebelar contra a doce caricia da caridade?
Não ouso falar daquilo que fiz, porque os Espíritos também tem o pudor de suas obras. Mas penso que a obra que iniciei é uma daquelas que devem contribuir muito para aliviar os vossos semelhantes. Com freqüência vejo Espíritos que pedem a missão de continuar a minha obra; vejo essas minhas suaves e queridas irmãs em seu piedoso e divino ministério; vejo-as a praticar a virtude que vos recomendo, com toda a alegria proporcionada por esta existência de devotamento e de sacrifícios. É para mim grande felicidade ver quanto seu caráter é honrado, quanto sua missão é apreciada e docemente protegida. Homens de bem, de boa e forte vontade, uni-vos para continuar, ampliando a obra de propagação da caridade. Encontrareis a recompensa nesta virtude, pelo seu próprio exercício. Não há alegria espiritual que ela não proporcione, já na presente existência. Sede unidos; amai-vos uns aos outros, conforme os preceitos do Cristo. Assim seja.
* * *
Agradecemos a S. Vicente de Paulo a bela e boa comunicação que teve a bondade de nos dar.
- Gostaria que fosse proveitosa a todos.
1.- A caridade pode ser compreendida de duas maneiras: a esmola propriamente dita e o amor dos semelhantes. Quando nos dissestes que era necessário abrir o coração ao pedido do infeliz que nos estende a mão, sem lhe perguntar se sua miséria é fingida, não quisestes falar da caridade do ponto de vista da esmola?
- Sim ; apenas nesse parágrafo.
2. - Dissestes que deveríamos deixar à justiça de Deus a apreciação de falsa miséria. Entretanto, afigura-se-nos que dar sem discernimento àqueles que não necessitam ou que poderiam ganhar a vida por um trabalho honesto, é encorajar o vício e a preguiça. Se os preguiçosos achassem facilmente aberta a bolsa alheia, multiplicar-se-iam ao infinito, em prejuízo dos verdadeiramente necessitados.
- Podeis discernir os que podem trabalhar e então a caridade vos obriga a tudo fazer para lhes proporcionar trabalho. Entretanto, também há pobres mentirosos, que sabem muito bem simular misérias que não padecem. Estes é que devem ser deixados à justiça de Deus.
3. - Aquele que apenas pode dar um centavo o que deve escolher entre dois infelizes que lhe pedem, não tem o direito do inquirir daquele que é realmente necessitado, ou deve dar sem exame ao que chega primeiro?
- Deve dar àquele que parece sofrer mais.
4. - Não se deve considerar como pertencendo à caridade a maneira por que é feita?
- E sobretudo na maneira de faze-la que está o mérito da caridade: a bondade é sempre indício de uma alma bela.
5. - Que tipo de mérito reconheceis naqueles geralmente chamados benfeitores rabugentos?
- Fazem o bem apenas pela metade. Seus benefícios são recebidos, mas não comovem.
6. - Disse Jesus: "Que a vossa mão direita não saiba o que faz a esquerda." Têm algum mérito aqueles que dão por ostentação?
- Têm apenas o mérito do orgulho, pelo qual serão punidos.
7. - A caridade cristã, na sua mais larga acepção, não compreende também a doçura, a benevolência e a indulgência para com as fraquezas alheias?
- Imitai a Jesus. Ele vos disse tudo isto. Escutai-o mais que nunca.
8. - É bem entendida a caridade, quando exclusiva entre as criaturas da mesma opinião ou do mesmo partido?
- Não. É sobretudo o espírito de seita e de partido que deve ser abolido, desde que todos os homens são irmãos. É sobre isto que nós concentramos os nossos esforços.
9. - Admitamos que uma pessoa vê dois homens em perigo, mas não pode salvar senão um. Um é sou amigo e o outro, inimigo. A quem deve salvar?
- Deve salvar o amigo, pois este poderia acusá-lo de não lhe ter amizade. Quanto ao outro, Deus há de tomar conta.

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