Mensagem

"Não permita que aquilo que você chama de amor se transforme em obsessão.
Amor é liberdade.
Amor é vida.
Jamais prisão ou limitação."

Militão Pacheco

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

A Passagem





Um dos grandes personagens da história da Terra, após várias e insaciáveis conquistas territoriais, inicia um processo de questionamento íntimo que o levou à parada de seu périplo pelos continentes temporariamente. Após esse período de conflitos, retomou suas lutas por maiores riquezas, mas já não com o mesmo ímpeto dos primeiros tempos. Não só pelo desgaste natural que a idade lhe impunha, mas particularmente por conta de que sentia a necessidade de modificar alguma coisa na estrutura de sua proposta, embora fosse homem de coragem e ligado às questões culturais, que colocava acima das aparências que as guerras lhe forneciam em suas sucessivas vitórias de então.

Sua sombra, após o primeiro período de instalação de um mundo novo e promissor, às custas de vidas e miséria, era a necessidade que sentia de deixar uma lembrança menos lesiva a respeito de sua passagem pela história e mais produtiva, já que após a conversação mais demorada com determinada personagem de um dos povos submetidos ao seu jugo, iniciava a percepção de que em algum momento deixaria de estar ali em função da natural morte de seu corpo.

Interessante é que sentia dentro de si que a perda da vida orgânica não seria o final de tudo, em absoluto. Sabia intimamente que mesmo deixando o corpo que habitava, teria sua integridade individual preservada e teria suas recordações, as lembranças de suas experiências durante a vida. Mas, em função justamente disso, iniciou o pensamento que desenvolvia uma nova consciência a respeito das outras pessoas. Não apenas e exatamente aquelas com as quais convivia contemporaneamente, mas todas as outras que viriam a viver depois, no decorrer da formação do mundo que se descortinava à sua vista.

Por toda a destruição que causara e causaria seria lembrado, certamente. De alguma maneira iria ter seu nome registrado nos livros que contariam sua saga, que ele até aqueles momentos julgava heróica, mas que já não tinha, após aquele diálogo, o mesmo brilho para ele, mesmo pensando em tudo o que construíra após dominar territórios e povos em sua jornada sucessiva iniciada anos passados.

Mas suas dúvidas o levavam a refletir que a morte, embora fosse encarada por ele como uma questão natural o amedrontava, já que após ela teria um encontro que seria definitivo: suas obras. Maldita criatura com a qual conversara tantas horas! Por qual razão havia conseguido implantar em sua mente aquela maneira de pensar? Ele havia sido conquistado pela primeira vez em sua experiência. Nem mesmo sua mãe conseguira infiltrar seu pensamento, mesmo sendo a mulher que era, com a personalidade fortíssima como a que tinha. Mas aquela figura, com suas frases marcantes, deixara em seus pensamentos a necessidade de fazer algo diferente do que havia feito até então.

De certo que ao iniciar sua jornada pelo mundo conhecido e descobrindo novas regiões em sua marcha para as conquistas havia deixado um rastro de sangue. Mas também havia construído uma nova sociedade. Impunha as armas, mas usava o diálogo, como havia aprendido nas escolas gregas e permeava a manutenção da cultura do povo subjugado além de comandar a instalação da cultura helenista tão profícua em sabedoria e conhecimento.

Queria, na verdade, elevar o mundo, pois o enriquecimento dos povos somente se concretizaria através do saber e ele tinha a consciência plena deste fator.

Em seus conflitos, questionava-se inquietamente a respeito do que deixaria de herança para o mundo. Sentia a importância de sua missão, pois percebia a relativa facilidade com a qual dominava as mentes mais singelas que eram conduzidas para a reconstrução de uma nova geração para a estruturação de uma nova comunidade planetária única, unida, com aproximação de ideais e culturas. Mas ao mesmo tempo sentia a necessidade de modificar suas disposições para que tivesse a possibilidade de ser reconhecido não como um conquistador implacável e sanguinário, mas um novo governante mundial, uma personagem que tivesse passado pelo mundo para ser o semeador de uma nova mentalidade.

Começava a crer que a passagem pela vida precisava ter uma importância diferenciada e que não é justo apenas passar, mas passar e deixar registros na passagem que tenham significância não para o indivíduo, mas principalmente para a coletividade, para a maioria das pessoas que também tenham a oportunidade de estar entre os vivos, de ter o contato com esta realidade com a qual estava ele tendo.

A vida precisaria dar bons frutos, que gerassem alegria, que fosse dadivosa, generosa, permeada de integridade, de solidariedade, de alegria no intercâmbio com as pessoas. A vida é, pensava ele, a força motriz para o aprendizado diante do Universo.

Então olhava para as estrelas, contemplava a imensidão e ficava ainda mais perplexo com a inteligência que estava por detrás de tudo. A beleza da natureza, o perfume das flores, a imagem das águas que geravam vida, a riqueza da diversidade das espécies, o encadeamento de tudo com tudo lhe faziam embevecer de admiração.

Tudo o que havia aprendido nas escolas da Grécia era agora visualizado em suas telas mentais. Algumas vezes, os seus comandados ficavam perturbados com seu estado incompreensível para todos, que o seguiam algumas vezes cegamente, apenas aguardando suas ordens, que davam sinais claros de enfraquecimento. Era, então, tido a conta de louco, pois não tinha mais o mesmo vigor dos primeiros anos de luta. Não tinha mais o brilho no olhar, a voz vibrante que simplesmente comandava a todos, então estava sendo desrespeitado pelas mentes afiladas nos vales da ignorância que imaginavam tratar-se apenas de um grande general.

Era, de fato, um comandante. Um guerreiro. Seguia sua trajetória, deixando rastro de dor e ranger de dentes enquanto simultaneamente irradiava à sua volta auspiciosas transformações pelos povos que conquistava, sempre com condescendência. Mas queria deixar de deixar marcas duras para iniciar uma nova fase de conquistas, mais brandas e elevadas. Voltadas para a Luz, que começava a conhecer melhor, embora a tivesse de algum modo registrada em sua intimidade.

Após aquela conversa, era um novo homem, um novo ser, diferente de tudo o que havia dispensado para si mesmo. E precisava transportar seus ideais para um novo patamar de consciência, acima daquele no qual vivera até então. Fazia a revolução íntima que estava gerando um novo homem, mais lúcido, mais sereno, menos dominador. Tanto que, apesar de as conquistas continuarem, quando mais se infiltrava no oriente, mais ameno e humano se tornava, poupando vidas e civilizações, transformando as conquistas e domínio de todos, permeando a tolerância para com os governantes e com os povos.

Era um novo homem, que veio a desencarnar por uma traição de um de seus seguidores, que julgava não estar mais o missionário em condições para a liderança, em função de sua loucura, pois era loucura tolerar, era insanidade perdoar, tolice semear a diplomacia. Seu corpo foi levado à sua mãe, quando ele ainda era jovem e ela o velou com muito amor, pois, à distância sentia todos os movimentos de consciência de seu filho, graças à profunda ligação que mantinham entre si, fundamentada esta ligação em amor autêntico, que ele só viera a compreender já no final da experiência da vida, quando sua sensibilidade fora realçada após uma única conversa com um Emissário de Jesus.

Albino Teixeira

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